A FORÇA DO RÁDIO NO SERINGAL
"Atenção, atenção senhor Antônio, conhecido por Antônio Canela Fina, que mora no seringal Sovaco da Onça, colocação Oco do Mundo. Sua mulher avisa que chegou na cidade hoje pela manhã. Avisa ainda que seu pai que veio se curar da malária foi atropelado. Quebrou as duas pernas, os braços, furou um olho, teve caganeira no hospital, continua com três cruzes de malária, mas passa bem. Por motivo de força maior ela pede que mande numerário pois não sabe quando vai voltar para o seringal. Ela pede que não esqueça de dar comida para as galinhas, o papagaio e os cachorros. Por favor, quem ouvir esta mensagem retransmitir ao destinatário. Abraços da esposa Hermelina".
A mensagem, um tanto trágica e cômica, faz parte do cotidiano dos funcionários da Rádio Difusora Acreana, carinhosamente chamada de Voz das Selvas, a mais antiga do Acre. O rádio para seringueiros e ribeirinhos funciona como internet na selva amazônica. É através dele que as pessoas se mantêm atualizadas sobre o mundo, mandam mensagens para parentes e amigos e ouvem música. No seringal pode faltar tudo, menos as pilhas que alimentam a caixinha de barulho.
Em 2002, o professor Francisco de Moura Pinheiro, o Dandão, fez um excelente trabalho sobre os impactos da comunicação de massa na Reserva Extrativista Chico Mendes, em Xapuri, no Acre. Ouviu depoimentos sobre a importância do rádio na região e colheu mensagens que expressam a cultura no nosso povo caboclo. Veja algumas:
“Atenção Manoel Ribeiro da Silva e Artemisa, no seringal Cachoeira, colocação Chora Menino. Jurandir Dionísio avisa que sua mãe foi operada e passa bem, graças a Deus. Aguarde novos avisos, amanhã, nesse mesmo horário. Abraços do pai amigo”.
“Atenção Neusa, na Estrada de Boca do Acre, ramal 75. Seu irmão, Antônio Gomes pede mandar os meninos apanhá-lo amanhã. O mesmo viaja no ônibus das seis horas. Vai com a Gercina. Abraços”.
“Atenção Tonico, na colocação Paxiubal. Sua irmã Mundoca pede para vir hoje ou amanhã, a fim de pegar umas encomendas, pois não quer mandar por outras pessoas. Caso não tenha o dinheiro da passagem, peça emprestado. Não é pra faltar. Abraços”.
As mensagens vão ao ar todos os dias no início da tarde. Sem medo de errar, o programa que tem o nome de Correspondente Difusora, é o mais ouvido na selva amazônica. Para mandar uma mensagem o usuário paga uma pequena quantia por cada vez que for lido o seu recado.
O seringueiro não vive sem o rádio. Quando se levanta para o trabalho por volta das três horas da manhã, a primeira ação é ligar o radinho para lhe fazer companhia durante a preparação do café e da comida que irá levar para a mata. Enquanto quebra o jejum, geralmente uma refeição com carne de caça, ele escuta solitariamente, uma música alegre que lhe conforte o coração. Depois de sair de casa só retorna no final da tarde para dar continuidade ao fabrico da borracha. O homem da floresta leva uma vida solitária na labuta diária. O rádio funciona como um grande companheiro nas horas de dor e alegria.
Na pesquisa, Dandão pincelou que apesar desses fatos reais e, provavelmente, irreversíveis, entretanto, ainda há muita utopia no que se pensa e no que se diz sobre inúmeros aspectos do conhecimento humano. Da Amazônia, por exemplo, não são poucos os que ainda a vêem com olhos semelhantes aos dos povos do século XVI, quando se pensava que na região se escondiam deslumbramentos, exotismos e maravilhas irreais. A Amazônia, sob esse prisma, se transformou no signo de uma fantasia sediada na natureza. E, como tal, muitos dos discursos sobre a região, até hoje, expressam a ilusão de um outro mundo.
A mensagem, um tanto trágica e cômica, faz parte do cotidiano dos funcionários da Rádio Difusora Acreana, carinhosamente chamada de Voz das Selvas, a mais antiga do Acre. O rádio para seringueiros e ribeirinhos funciona como internet na selva amazônica. É através dele que as pessoas se mantêm atualizadas sobre o mundo, mandam mensagens para parentes e amigos e ouvem música. No seringal pode faltar tudo, menos as pilhas que alimentam a caixinha de barulho.
Em 2002, o professor Francisco de Moura Pinheiro, o Dandão, fez um excelente trabalho sobre os impactos da comunicação de massa na Reserva Extrativista Chico Mendes, em Xapuri, no Acre. Ouviu depoimentos sobre a importância do rádio na região e colheu mensagens que expressam a cultura no nosso povo caboclo. Veja algumas:
“Atenção Manoel Ribeiro da Silva e Artemisa, no seringal Cachoeira, colocação Chora Menino. Jurandir Dionísio avisa que sua mãe foi operada e passa bem, graças a Deus. Aguarde novos avisos, amanhã, nesse mesmo horário. Abraços do pai amigo”.
“Atenção Neusa, na Estrada de Boca do Acre, ramal 75. Seu irmão, Antônio Gomes pede mandar os meninos apanhá-lo amanhã. O mesmo viaja no ônibus das seis horas. Vai com a Gercina. Abraços”.
“Atenção Tonico, na colocação Paxiubal. Sua irmã Mundoca pede para vir hoje ou amanhã, a fim de pegar umas encomendas, pois não quer mandar por outras pessoas. Caso não tenha o dinheiro da passagem, peça emprestado. Não é pra faltar. Abraços”.
As mensagens vão ao ar todos os dias no início da tarde. Sem medo de errar, o programa que tem o nome de Correspondente Difusora, é o mais ouvido na selva amazônica. Para mandar uma mensagem o usuário paga uma pequena quantia por cada vez que for lido o seu recado.
O seringueiro não vive sem o rádio. Quando se levanta para o trabalho por volta das três horas da manhã, a primeira ação é ligar o radinho para lhe fazer companhia durante a preparação do café e da comida que irá levar para a mata. Enquanto quebra o jejum, geralmente uma refeição com carne de caça, ele escuta solitariamente, uma música alegre que lhe conforte o coração. Depois de sair de casa só retorna no final da tarde para dar continuidade ao fabrico da borracha. O homem da floresta leva uma vida solitária na labuta diária. O rádio funciona como um grande companheiro nas horas de dor e alegria.
Na pesquisa, Dandão pincelou que apesar desses fatos reais e, provavelmente, irreversíveis, entretanto, ainda há muita utopia no que se pensa e no que se diz sobre inúmeros aspectos do conhecimento humano. Da Amazônia, por exemplo, não são poucos os que ainda a vêem com olhos semelhantes aos dos povos do século XVI, quando se pensava que na região se escondiam deslumbramentos, exotismos e maravilhas irreais. A Amazônia, sob esse prisma, se transformou no signo de uma fantasia sediada na natureza. E, como tal, muitos dos discursos sobre a região, até hoje, expressam a ilusão de um outro mundo.
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